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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Crônica do Dia


Continuando com mais um dia de postagem, temos o texto de Paulo Cunha que fala sobre o livro "A Negação do Brasil" escrito por Joel Zito Araújo que deu origem ao documentário de mesmo nome e que foi exibido dia 17 de agosto para os alunos da Oficina de crônicas da UNATI.  

A Negação do Brasil


A negação do Brasil - O negro na telenovela brasileira, do diretor e roteirista de TV Joel Zito Araújo, vai fundo no tema da exclusão do negro das tramas do horário nobre. Os negros fazem parte da teledramaturgia brasileira desde o seu início, mas sua imagem sempre foi estereotipada. 

Muito raramente - e só de uns anos para cá - ele interpreta o papel de um rico empresário, de um grã-fino, de herói. Nas novelas brasileiras, o negro (ou o mulato) é sempre o malandro cheio de ginga, que samba no pé. No fundo, passa uma imagem de desleixo, falta de responsabilidade ou mesmo de marginal, o que é altamente negativo para fixação do seu caráter. O autor narra como essa idéia surgiu e mapeia, com impressionante precisão, a trajetória do negro na teledramaturgia brasileira.

Mas a TV é apenas o espelho do preconceito e do que o autor chama de "a negação do Brasil", um país que nega sua própria realidade. A ausência do negro na TV ou sua imagem subalterna, quando aparece, são conseqüências de um preconceito racial gerado pela exclusão social das populações negras do país, as mais marginalizadas e que apresentam os indicadores sociais mais desfavoráveis - apesar de o Brasil ser um país miscigenado, com predominância negra. A obra mostra que, mesmo na sociedade brasileira atual, negros e índios "continuam vivendo as mesmas compulsões desagregadoras de uma auto-imagem depreciativa, gerada por uma identidade racial negativa e reforçada pela indústria cultural brasileira, a qual insiste simbolicamente no ideal de branqueamento", como pontua o autor, em uma passagem do livro.

Segundo ele, entre 1980 e 1990, houve algumas mudanças nesse pensamento, ainda que tímidas. A telenovela Corpo a Corpo, onde aparece uma personagem vítima de preconceito racial, Sonia, vivida pela atriz Zezé Motta. Essas duas décadas são consideradas pelo autor como um período de ascensão do negro na telenovela brasileira. No entanto, teria permanecido a construção de uma identidade de "branquitude" na sociedade brasileira, onde as imagens dominantes, em especial dos subtextos, reforçam o elogio dos traços brancos como o ideal de beleza dos brasileiros. A nossa diversidade racial e cultural transforma-se, nas telenovelas, no paradoxo de um Brasil branco.Por fim, o livro mostra, de forma contundente, que o lugar do negro nas tramas exibidas na televisão não mudou e que continua a se reproduzir no século 21. O autor consegue aproximar a televisão da sociedade brasileira. Analisa o papel da mídia na história da telenovela brasileira, mostrando como são representados os negros, e as conseqüências dessa representação no processo de construção de sua identidade. Os dados apresentados no livro são irrefutáveis. Os gráficos, quadros e dados estatísticos provam que a telenovela brasileira ainda não dá visibilidade à composição racial do país, praticando, assim, uma negação da diversidade racial brasileira.Joel Zito Araújo é cineasta, diretor e roteirista de TV, além de doutor em ciências da comunicação pela ECA-USP, onde participa do Núcleo de Pesquisa de Telenovela. Sua relação com a questão do racismo vem de longa data. Realizou, a partir de 1984, 24 documentários e 22 médias metragens, sempre tratando das relações do negro na sociedade brasileira. Em 2000, dirigiu o documentário A negação do Brasil, sobre a participação de atores negros na televisão, que depois virou o livro ora em comento. Seu último filme, Filhas do Vento, também sobre o tema racismo, foi protagonizado pelos atores Milton Gonçalves e Thaís Araújo.


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