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sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Crônica do dia

Terminando a semana, postamos a crônica do aluno Samuel, em que trata sobre como lidar com a morte. Boa leitura!

O júbilo da morte 

A civilização ocidental encara o processo natural da morte, como algo extremamente doloroso, de grande tristeza e tenebroso. Diferentemente, muitos outros povos, como os do Oriente, os nativos americanos, pensam e sentem o oposto. 
Pelas nossas tradições ocidentais, herdeiras da cultura hebraico-cristã, torna-se difícil, pela não compreensão profunda do assunto, lidar com o fenômeno da morte física. Este fato é impossível de ser aceito, por exemplo, por uma mãe que perde um filho - carne de sua carne, sangue de seu sangue. Porque esquecem e, principalmente, porque desconhecem a transformação da matéria em energia, a qual é eterna, passam por aflição que lhes abate o ânimo e o desejo de viver, manifestando uma ilusória derrocada da vida, como se fosse um fim absoluto. 
Porém, a vida continua: nos que sobrevivem e nos que estão a chegar. 
Aquelas outras culturas abordam o assunto com leveza e sentimento elevado, sabendo da continuidade da existência como um todo. Ao corpo morto dão a atenção restrita ao necessário, ou seja, honrá-lo com um enterro ou com uma cremação, simplesmente. Também honram a memória de seus antepassados, com cerimônias de culto aos mortos, que podem se nos apresentar como uma visita aos túmulos em épocas apropriadas, ou festejando, em certas ocasiões, coletivamente. 
No extremo oriente, as famílias têm em suas residências um local próprio, tal qual um nicho, onde colocam fotos ou objetos pertencentes àqueles que partiram, onde acendem uma vela ou ligam uma lâmpada para iluminar, com reverência de gestos e de preces para com seus entes queridos, que já não estão entre nós. É sempre uma lembrança que mantém viva a consciência da eternidade. 
Interessante sabermos que há, na Índia, uma seita religiosa que comemora de um modo invertido o nascimento e a morte. Quando nasce uma criança, fazem uma lamentação e vestem-se de roupas escuras. Quando ocorre um falecimento, cantam e dançam com uma alegria contagiante e vestem-se de roupas claras, de preferência usando o branco. Alegam que quando alguém nasce é porque morreu no além; e quando alguém falece é porque renasce em outra dimensão. E, assim, a vida continua ininterruptamente... 
Nas culturas nativo-americanas, a consideração com o corpo físico é muito relativa. Eles têm uma noção latente da continuidade existencial. Logo, o que possa acontecer com o cadáver é o que tem a menor importância. Quando abatiam um inimigo valoroso, comiam da sua carne para absorver a energia do valente guerreiro – assim eram suas crenças. Fora isso, também festejava o falecimento dos de sua própria tribo, com rituais respeitosos. 
A popularização das festas dos mortos originou-se de uma mescla das duas culturas, mediante a introdução da catequese católica pelos colonizadores europeus. Nestas festas, amalgamam-se o sagrado e o profano. Desde que predomine a conduta dos nativos, ocorre uma alegria contagiante com o tema da morte. Muitas são as brincadeiras e as comilanças. E assim é que tem que ser... 
Devemos tirar lições dessas atividades sociais, porque a vida não termina com a morte do corpo - esta é simplesmente uma transformação. Assim como com uma semente que tem a aparência de coisa morta, dali surge a vida que é sagrada e preciosa. Decompõe-se a matéria - dito corpo físico - e liberta-se a energia eterna consciente e inteligente, que os antepassados denominavam como a alma. 
Em nossa sociedade, de culturas diversificadas, ainda que um falecimento redunde em lamentações de carpideiras, também predomina, bem lá fundo de nossas mentes, uma subconsciência da eternidade do Ser. Oriunda do nosso meio popular, lembremo-nos da música do nosso poeta Noel Rosa, cujos versos manifestam tal crença em outras realidades: 
“Quando eu morrer, não quero choro nem vela, 
Quero uma fita amarela gravada com o nome dela. 
Se existe alma, se há outra encarnação, 
Eu queria que a mulata sapateasse no meu caixão”. 
Etc. 
Por isso mesmo, deixemos a tristeza para lá após o choque inicial de uma separação, que nos surpreende com o inesperado ou com a interrupção de uma esperança de recuperação, talvez não permitida pelo Equilíbrio Universal, o qual é Onisciente. A aceitação do fato nos traz uma grande e profunda Paz. 
O melhor é manter em nossas mentes e em nossos corações simbólicos as boas lembranças dos nossos entes queridos, que partiram antes de nós, e tenhamos certeza e fé de que eles nos aguardam. Tenhamos sempre para com eles bons e alegres pensamentos, com agradecimentos. 
Justifica-se comemorar com grande júbilo a festa dedicada aos que transporem os portais interdimensionais, pois a Eternidade nos envolve como uma realidade inegável e absoluta. 

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