Texto da aluna Rosa Rinaldi sobre a comunicação e a expressão contemporâneas.
Fragmentos
“A liberdade consiste em se fazer
tudo o que não prejudica os outros”
(Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão)
Av. Rio Branco, quarta-feira às 14h30.
Paro para esperar o sinal e começam os
fragmentos de informações, as mais variadas possíveis, e daí serem tão
especiais.
Alguém ao meu lado diz “... mas já falei
para você que não quero assim...”; do outro lado, uma voz feminina um tanto
irritada complementa “... mas isso é tudo o que eu queria”, e risinhos...
Aponto minha antena auditiva para trás, onde um homem forte e bem suado exclama
para o mundo “... pô! Mas isso é sacanagem. Vai ou não vai querer? ...”
Assustada, olho para o lado de onde
havia partido o primeiro contato e reparo que outras pessoas já se acomodaram
no lugar e que, com pequenos aparelhos acoplados ao ouvido, trazem à baila as
mais variadas discussões.
Torcendo para o sinal não abrir, mas
preocupada com o acúmulo de pessoas, tento me concentrar para ouvir mais
informações.
Não demora e novamente à direita uma jovem
com todo jeito de militar na área do Direito reclama em altos brados “... mas o
quê? Aquele juiz cafajeste não deu a liminar?”; penso assustada e com pena do
pobre juiz que nem de longe imagina que está sendo seu trabalho discutido na av.
Rio Branco e, sem que eu possa pensar muito, uma voz, que percebo ser de um
rapaz bem jovem que havia se postado na minha frente, exclama “... pqp, o que
ela pensa que é?”.
Rapidamente tento organizar meus
pensamentos, mas não era um juiz que acabara de ser espinafrado pela moça, e
então quem era a que pensava ser, mas não era?
Abre o sinal. Até parece música do
Paulinho da Viola que narra o encontro de dois amigos no sinal de trânsito, e uma
multidão vem ao encontro da multidão que vai, assim como eu, para simplesmente
trocar de lado da rua.
Não é tão simples assim. A multidão que
vem, na sua maioria, também fala ao celular e se entretece com a que vai no
sentido contrário, e são muitos fragmentos de conversas que por vezes fazem
sentido e formam uma teia, por outras despertam a vontade de tecer tal qual uma
trama essa sequência de colóquios.
O que me assombra é que tornou-se muito
fácil expor sua vida numa conversa de telefone celular, e tornar públicas todas
as belezas e mazelas que se carrega.
A impressão que tenho é que nós não estávamos
preparados para o uso das novas
tecnologias, e as gerações mais novas, já nascendo dentro deste contexto de
falar tudo, com todos, em alto som em seus celulares, transformou nossas vidas
em um grande drama popular, onde não temos nenhum pudor de falar publicamente
em travessia de ruas, transportes coletivos, etc, os atos de nossa comédia de
vida.
Não sou velha, sou antiga, e prefiro
ainda uma conversa ao pé do ouvido ou um longo papo ao telefone com os amigos,
espichada na minha poltrona predileta.
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