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terça-feira, 7 de junho de 2011

Crônica do Dia

Hoje, na nossa semana de lendas/costumes, o texto do aluno Samuel Kauffmann fala sobre caráter, reputação e  também sobre coisas que a nossa sociedade valoriza, fazendo com que o caráter e a reputação sejam cada vez mais esquecidos e desvalorizados.         
               
REPUTAÇÃO OU CARÁTER ?

Recordei-me, esta semana, de que estando em um restaurante com espaço exíguo, em companhia de minha esposa, sentados numa mesa vizinha bem próxima, estavam um senhor e um rapaz já maduro conversando sobre um assunto deveras interessante e sempre atual. Não pude deixar de escutá-los, com uma curiosidade inocente.  Como já se passara bastante tempo desde aquele dia,  resolvi registrar o diálogo, procurando não falhar em minha memória.
Logo pelas  primeiras palavras ouvidas, depreendi que eram pai e filho.  Pelo que fui escutando, conclui que o pai, empenhado em auxiliar o filho, que se encontrava em crise existencial,  envolvido em conflitos sociais e de personalidade e extremamente ansioso, formulou uma pergunta provocativa,  para o filho pensar e responder.
““ O pai:
- O que mais importa a ti?  A tua reputação ou o teu caráter? Por favor, não se apresse em responder. Medite e reflita sobre este assunto, porque o autoconhecimento nos amplia a consciência, bem como nos favorece o autocontrole e o reequilíbrio emocional, tão necessário ao ser humano.
Poucos minutos após, premido pela ansiedade, o filho comunicou ao pai o resultado de suas elucubrações.
- Reputação é o que as pessoas pensam ao meu respeito.
O pai:
- Sim, e...
O filho:
- Caráter é o  que eu sou quando ninguém está me olhando.
O pai:
- Quando ninguém está te olhando? Somente quando ninguém está te olhando? Então, quando alguém estiver te olhando tu deixas de ser o que és, com o caráter ausente, ou mesmo inexistente? Senão, vejamos:  a tua reputação pode ser aquilo que almejas em ser reconhecido e aceito socialmente. Logo, em teu intimo, te importas com o que pensam a teu respeito, ou não? Porque se souberes sobre o pensamento alheio, procurarás mudar a tua apresentação, conforme te sejam favorável ou desfavorável.
Interrompendo o pai, o filho prosseguiu:
-Desta forma, preocupo-me mais com o meu caráter do que com minha reputação; porque o caráter é o que você realmente é;enquanto a reputação é apenas o que os outros pensam que você é. E o que os outros pensam é problema deles!
- Opa! (disse o pai) Alto lá! Primeiro, estamos falando de ti e não de mim. Segundo, que o teu caráter é o que tu “julgas” que realmente és. Terceiro, que a reputação é “apenas” o que os outros pensam que tu és.  E que os outros pensam é problema deles! Será? Será que a percepção deles sobre ti,  realmente não o incomoda,conforme tu percebes a reação deles em resposta às tuas atitudes,teus comportamentos ou tuas falas? E será que isto, de um modo global, não afeta o teu caráter?  Assim sendo, peço-te que definas “caráter” e “reputação”, para que  possamos ampliar nossas consciências sobre este assunto, tão instigante.
Afoito, antes da definição requerida, o filho adiantou algo como que um provérbio: 
- “A reputação é o que os homens dizem de você junto a sua sepultura; o caráter é o que os anjos dizem de você diante do trono de Deus”. 
O pai:
- Ora, que expressão tão poética e também mística  – de onde  retirastes tal  jóia? Comentaremos sobre esta afirmação literária mais adiante. OK?  
Continuou o filho: 
- As circunstâncias entre as quais você vive determinam sua reputação. A verdade em que você acredita determina seu caráter.  A reputação é o que acham que você é. O caráter é o que você realmente é...  A reputação é o que você tem quando chega a uma comunidade nova.  O caráter é o que você tem quando vai embora...  A reputação é feita em um momento. O caráter é construído em uma vida inteira...  A reputação torna você rico ou pobre. O caráter torna você feliz ou infeliz... “O caráter é como uma arvore e a reputação como sua sombra.  A sombra é o que nós pensamos dela; arvore é a coisa real”. 
Argumentou o pai: 
- Que belíssima finalização! Uma analogia filosófica! Novamente, não estamos falando de mim, mas de ti!  Talvez eu esteja errado, porém, estas tuas últimas palavras, parece-me, retiradas de alguma fonte discursiva, muito bem elaborada. Confesso: gostaria de saber qual é a fonte,  se acertei. Contudo, continuemos com esta especulação sobre tais virtudes, ou vícios, humanos. A meu ver, o caráter é uma estrutura bem no interior da mente, como que um “esqueleto”, a sustentar a personalidade, que é uma camada da mente em contato com o exterior do individuo. 
Desde que nós nascemos, as impressões advindas do mundo exterior, “filtradas” pela personalidade em formação,  vão fortificando o caráter, consolidando-o. À medida que crescemos,imersos no “oceano da vida”, levados por correntes aleatórias sujeitos às vagas ondulantes, sob o julgamento da consciência, a personalidade vai se afirmando,tornando-se mais densa, fornecendo os meios pelos quais o caráter também se  adensa e se fortifica. Um caráter forte não significa, forçosamente, um bom caráter. Sendo a personalidade fruto do meio ambiente, ela passa para o interior da mente as características a serem absorvidas pelo caráter,  tornando-o, então, um bom ou mau caráter. E lá do interior do individuo, vem como que uma energia, a expor  uma personalidade boa ou má.  Veja como, personalidade e  caráter, estão tão intimamente  ligados, semelhantes, figurativamente, a almas gêmeas.
- Mas, a reputação o que lhe parece? – interrompeu o filho.
O pai:
- Quanto  à reputação, perguntemos antes o quanto ela afeta o caráter; que influências, vindo do social, poderiam desestabilizar um caráter  enfraquecido por  múltiplas escolhas inconscientes?  Agressões, afrontas, desrespeito, desamor? Se a conduta do indivíduo opta por escolhas inadequadas a determinados momentos ou  circunstâncias, isto demonstra que o sujeito está a se “PRÉ - OCUPAR” com sua reputação; importa ao ego dele a opinião alheia  - quer ser visto como homem ou mulher de bem; se culto, por formação superior, procura expor, vaidosamente, tal cultura; apresenta-se com vestimentas sempre na última moda, além da necessidade profissional; igualmente, possuir o automóvel do ano e se possível 0 km; enfim, mostrar as suas posses materiais; e etc..  Tudo isto vem a demonstrar o quanto tal individuo valoriza mais a sua reputação do que os cuidados com seu amor próprio, bem como pelos semelhantes – que tem por consequência evidenciar uma personalidade e caráter antipáticos a outros indivíduos. Num outro enfoque, podemos justificar a boa reputação, com suporte na boa personalidade e no bom caráter, com aspectos positivos, desde que apoie uma relação social saudável, como, por exemplo, manter uma liderança necessária ao equilíbrio sócio-emocional do grupo,seja profissional ou familiar.  Espero ter esclarecido, um pouco, sobre este fascinante assunto. ””
Bem, infelizmente, já estávamos a terminar o nosso jantar e tivemos de nos levantar, não sem antes uma mesura cortês para os vizinhos, que mal se aperceberam de nós. Fiquei a lamentar desconhecer a conclusão daquela conversa. Fica por conta da tua imaginação, leitor (a), concluí-la.

                                                                                                                         Samuel Kauffmann

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